Celeste Rodrigues foi uma fadista tradicional das mais
conceituadas do universo musical português, considerada uma referência pelas
mais jovens gerações de intérpretes.
Maria Celeste Rebordão Rodrigues nasceu no Fundão a 14 de
Março de 1923. Quando tinha 5 anos os seus pais vieram para Lisboa e
estabeleceram-se no bairro de Alcântara. Celeste Rodrigues frequentou a Escola
Primária da Tapada e recorda a sua infância como igual à de tantas outras
crianças, com a excepção de se reconhecer como uma "maria rapaz",
traquina, embora tímida e envergonhada. Quando não quis estudar mais,
empregou-se numa fábrica de bolos. E, mais tarde, junto
com a irmã Amália, trabalha num ponto de venda de artigos regionais na Rocha
Conde de Óbidos (cf. “Álbum da Canção”, 1 de Maio de 1967).
A sua carreira é impulsionada pelo empresário José Miguel, à data proprietário
de várias casas típicas, que depois de a ter ouvido cantar, entre amigos, na Adega
Mesquita, insiste na sua profissionalização como fadista. Celeste Rodrigues
estreia-se em 1945 no Casablanca (actual Teatro ABC) e, dois meses depois,
ingressa numa Companhia teatral e parte para o Brasil, acompanhando a irmã
Amália Rodrigues na representação da opereta "Rosa Cantadeira" e da
revista "Boa Nova". Esta digressão acaba por durar cerca de 1 ano.
Ao longo da sua carreira Celeste Rodrigues receberá diversos convites para
integrar peças de teatro, mas recusa sempre. No regresso a Lisboa dá continuidade
à sua carreira de fadista, apresentando-se no elenco de diversos espaços de
fado como o Café Latino, o Marialvas ou a Urca (na Feira Popular). Mais tarde,
transita do Luso para a Adega Mesquita, onde se mantém por 4 anos.
Posteriormente integra os elencos da Tipóia e da Adega Machado. No início da
década de 1950 a fadista regressa ao Brasil, desta feita para actuar na rádio,
na televisão e no restaurante Fado, de Tony de Matos, sempre com assinalável
êxito.
Aos 30 anos casa-se com o actor Varela Silva, com quem tem
duas filhas. É contratada para cantar na casa Márcia Condessa e, em Janeiro de
1957, torna-se proprietária do restaurante típico A Viela, um espaço
privilegiado para a convivência de poetas, intelectuais, cantores e de longas
tertúlias, mas ao qual renuncia 4 anos mais tarde, confessando não sentir
“queda para o negócio” (cf. Álbum da Canção, 1 de Maio de 1967). Na década de
1950 Celeste Rodrigues era já uma figura ímpar no universo do Fado, levando-o
além fronteiras, para países como o Brasil, Espanha, Congo Belga, África
Inglesa, Angola e Moçambique. E, em território nacional, era também uma fadista
consagrada, conforme revela à revista “Álbum da Canção”, foi das primeiras “a
actuar no período experimental da RTP, no teatro da Feira Popular (…)” e “a
primeira a enfrentar as câmaras, quando os estúdios do Lumiar passaram da fase
de experiências para as emissões regulares.” (cf. “Álbum da Canção”, 1 de Maio
de 1967), actuações em espaços bem demonstrativos da sua grande popularidade.
Continuando a pautar o seu percurso profissional pelas
apresentações nas casas de fado de Lisboa, Celeste Rodrigues integra o elenco
da Parreirinha de Alfama no início da década de 1960, e aí permanece por mais
de 10 anos, altura em que João Ferreira-Rosa a convida para o elenco da Taverna
do Embuçado, onde faz actuações ao longo de 25 anos. Posteriormente actuará nas
casas Bacalhau de Molho e Casa de Linhares. A fadista concretiza uma carreira
de sucesso, com actuações nas casas típicas, em programas de rádio e televisão,
nacionais e internacionais. No auge da sua carreira artística, celeste
Rodrigues foi também convidada a gravar para a BBC em Londres, a convite de
Richard Engleby. E, no decurso de todos estes anos de actividade intensa, teve
oportunidade de passar por algumas das maiores cidades do mundo.
Apesar das
sucessivas comparações com Amália Rodrigues, sua irmã, Celeste Rodrigues possui
uma autenticidade única, uma forma singular de interpretação, patente nos temas
do seu repertório, como os populares “A lenda das algas” (Laierte Neves – Jaime
Mendes), “Saudade vai-te embora” (Júlio de Sousa), “O meu xaile” (Varela
Silva), ou o tema de Manuel Casimiro “Olha a mala”, que se tornou o seu maior
êxito de vendas, entre os quase 60 discos que gravou.
Celeste foi uma das primeiras Fadistas a realmente
internacionalizar-se, cantando em variadíssimos países e nos grandes palcos
mundiais, onde podemos destacar, entre outros, o Concertgebouw em Amesterdão, o
Carnegie Hall em Nova York ou o Cité de la Music em Paris
Corre o ano de 2005 quando Ricardo Pais, director do Teatro Nacional São João,
a desafia a participar no espectáculo "Cabelo Branco é Saudade" ao
lado de outras três grandes vozes do Fado: Argentina Santos, Alcindo de
Carvalho e Ricardo Ribeiro.
Mais recentemente, um dos momentos altos da sua carreira é a
edição do álbum “Fado Celeste”, editado em 2007 na Holanda, e que reúne fados
tradicionais e inéditos com letras de autores contemporâneos, como Helder
Moutinho e Tiago Torres da Silva. Nesse mesmo ano, em Outubro, decorreu no
auditório do Museu do Fado uma homenagem à fadista, iniciativa da Associação
Portuguesa dos Amigos do Fado, num reconhecimento da “voz bonita, capacidade
interpretativa e a regularidade de uma carreira.” (declarações de Julieta
Estrela de Castro, presidente da APAF à agência Lusa).
Em 2010, estreia o documentário sobre a sua vida, intitulado
Fado Celeste e realizado pelo seu neto Diogo Varela Silva. Em 2015 em jeito de
homenagem pelos seus 70 anos de carreira, a secção Herat Beat do festival
Doclisboa, abre com uma remontagem desse mesmo documentário, intitulado apenas,
Celeste.
Em 2012 é lhe atribuído pelo Presidente da República o grau de Comendadora da Ordem do Infante D.
Henrique.
Selecção de fontes de
informação:
“Guitarra de Portugal”, 15 de Setembro de
1946;
“A Voz de Portugal”, 01 de Outubro de
1956;
"Álbum da Canção", nº 51, 01 de
Maio de 1967;
“Única”, 14 de Abril de 2006.
“Cabelo branco é saudade” (2005), programa do
espectáculo, Porto, Teatro Nacional de São João.
Última
actualização: Agosto/2018