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Celeste Rodrigues

(N. 14 março, 1923 - M. 1 agosto, 2018)

Celeste Rodrigues foi uma fadista tradicional das mais conceituadas do universo musical português, considerada uma referência pelas mais jovens gerações de intérpretes.

Maria Celeste Rebordão Rodrigues nasceu no Fundão a 14 de Março de 1923. Quando tinha 5 anos os seus pais vieram para Lisboa e estabeleceram-se no bairro de Alcântara. Celeste Rodrigues frequentou a Escola Primária da Tapada e recorda a sua infância como igual à de tantas outras crianças, com a excepção de se reconhecer como uma "maria rapaz", traquina, embora tímida e envergonhada. Quando não quis estudar mais, empregou-se numa fábrica de bolos. E, mais tarde, junto com a irmã Amália, trabalha num ponto de venda de artigos regionais na Rocha Conde de Óbidos (cf. “Álbum da Canção”, 1 de Maio de 1967).

A sua carreira é impulsionada pelo empresário José Miguel, à data proprietário de várias casas típicas, que depois de a ter ouvido cantar, entre amigos, na Adega Mesquita, insiste na sua profissionalização como fadista. Celeste Rodrigues estreia-se em 1945 no Casablanca (actual Teatro ABC) e, dois meses depois, ingressa numa Companhia teatral e parte para o Brasil, acompanhando a irmã Amália Rodrigues na representação da opereta "Rosa Cantadeira" e da revista "Boa Nova". Esta digressão acaba por durar cerca de um ano. Ao longo da sua carreira Celeste Rodrigues receberá diversos convites para integrar peças de teatro, mas recusa sempre. Só mais tarde, em 1992, aceita o convite para integrar o elenco do filme "Xavier", de Manuel Mozos. A partir daí, outras longas-metragens se seguiram: em 2018, participou em "Cabaret Maxime", de Bruno de Almeida e, por fim, no "Alfama em Si", dirigido pelo seu neto, o realizador Diogo Varela Silva. Após a tournée, no regresso a Lisboa, dá continuidade à sua carreira de fadista, apresentando-se no elenco de diversos espaços de fado como o Café Latino, o Marialvas ou a Urca (na Feira Popular). Mais tarde, transita do Luso para a Adega Mesquita, onde se mantém por 4 anos. Posteriormente integra os elencos da Tipóia e da Adega Machado. No início da década de 1950 a fadista regressa ao Brasil, desta feita para actuar na rádio, na televisão e no restaurante Fado, de Tony de Matos, sempre com assinalável êxito. 

Aos 30 anos casa-se com o actor Varela Silva, com quem tem duas filhas. É contratada para cantar na casa Márcia Condessa e, em Janeiro de 1957, torna-se proprietária do restaurante típico A Viela, um espaço privilegiado para a convivência de poetas, intelectuais, cantores e de longas tertúlias, mas ao qual renuncia 4 anos mais tarde, confessando não sentir “queda para o negócio” (cf. Álbum da Canção, 1 de Maio de 1967). Na década de 1950 Celeste Rodrigues era já uma figura ímpar no universo do Fado, levando-o além fronteiras, para países como o Brasil, Espanha, Congo Belga, África Inglesa, Angola e Moçambique. E, em território nacional, era também uma fadista consagrada, conforme revela à revista “Álbum da Canção”, foi das primeiras “a actuar no período experimental da RTP, no teatro da Feira Popular (…)” e “a primeira a enfrentar as câmaras, quando os estúdios do Lumiar passaram da fase de experiências para as emissões regulares.” (cf. “Álbum da Canção”, 1 de Maio de 1967), actuações em espaços bem demonstrativos da sua grande popularidade. 

Continuando a pautar o seu percurso profissional pelas apresentações nas casas de fado de Lisboa, Celeste Rodrigues integra o elenco da Parreirinha de Alfama no início da década de 1960, e aí permanece por mais de 10 anos, altura em que João Ferreira-Rosa a convida para o elenco da Taverna do Embuçado, onde faz actuações ao longo de 25 anos. Posteriormente actuará nas casas Bacalhau de Molho e Casa de Linhares. A fadista concretiza uma carreira de sucesso, com actuações nas casas típicas, em programas de rádio e televisão, nacionais e internacionais. No auge da sua carreira artística, Celeste Rodrigues foi também convidada a gravar para o programa "Panorama", da BBC, em Londres, a convite de Richard Dimbleby e para o The Ed Sullivan Show, do canal norte-americano CBS. E, no decurso de todos estes anos de actividade intensa, teve oportunidade de passar por algumas das maiores cidades do mundo. 

Apesar das sucessivas comparações com Amália Rodrigues, sua irmã, Celeste Rodrigues possui uma autenticidade única, uma forma singular de interpretação, patente nos temas do seu repertório, como os populares “A lenda das algas” (Laerte Neves – Jaime Mendes), “Saudade vai-te embora” (Júlio de Sousa), “O meu xaile” (Varela Silva), ou o tema de Manuel Casimiro “Olha a mala”, que se tornou o seu maior êxito de vendas, entre os quase 60 discos que gravou. 

Celeste foi uma das primeiras Fadistas a realmente internacionalizar-se, cantando em variadíssimos países e nos grandes palcos mundiais, onde podemos destacar, entre outros, o Concertgebouw, em Amesterdão, o Carnegie Hall, em Nova York, ou o Cité de la Musique, em Paris.

Corre o ano de 2005 quando Ricardo Pais, director do Teatro Nacional São João, a desafia a participar no espectáculo "Cabelo Branco é Saudade" ao lado de outras três grandes vozes do Fado: Argentina Santos, Alcindo de Carvalho e Ricardo Ribeiro.

Mais recentemente, um dos momentos altos da sua carreira é a edição do álbum “Fado Celeste”, editado em 2007 na Holanda, e que reúne fados tradicionais e inéditos com letras de autores contemporâneos, como Hélder Moutinho e Tiago Torres da Silva. Nesse mesmo ano, em Outubro, decorreu no auditório do Museu do Fado uma homenagem à fadista, iniciativa da Associação Portuguesa dos Amigos do Fado, num reconhecimento da “voz bonita, capacidade interpretativa e a regularidade de uma carreira.” (declarações de Julieta Estrela de Castro, presidente da APAF à agência Lusa). 

Em 2010, estreia o documentário sobre a sua vida, intitulado Fado Celeste e realizado pelo seu neto Diogo Varela Silva. Em 2015 em jeito de homenagem pelos seus 70 anos de carreira, a secção Herat Beat do festival Doclisboa, abre com uma remontagem desse mesmo documentário, intitulado apenas, Celeste. 

Em 2012 é lhe atribuído pelo Presidente da República o grau de Comendadora da Ordem do Infante D. Henrique.

Depois dos 80, Celeste descobriu o gosto pela pintura. Em Julho de 2017, foi desafiada pelo pintor moçambicano Roberto Chichorro, seu amigo, para fazer uma exposição em nome próprio, intitulada "Cores do Fado".

Celeste cantou até ao fim. Para além de participar em vários projectos, como o "Brincar aos Fados" e "Amália As Vozes do Fado", os seus últimos concertos, a 7 de Abril de 2018  e a 11 de Maio do mesmo ano, encheram, respectivamente o Town Hall, em Nova Iorque e o Teatro Tivoli, em Lisboa. 

Celeste Rodrigues faleceu a 1 de Agosto de 2018 e, desde essa altura, várias homenagens se sucederam. A 21 de Março de 2019, no CCB, vários fadistas prestaram-lhe homenagem num concerto intitulado "Fado Celeste", com direcção de Diogo Varela Silva e, em 2023, o Museu do Fado inaugura uma exposição temporária, comemorativa do centenário do seu nascimento. No âmbito da exposição, são também divulgados duas faixas - "Se alguém me procurar" e "A noite do meu bem" - regravados por Celeste aos 95 anos.

 

Fonte:

“Guitarra de Portugal”, 15 de Setembro de 1946;

“A Voz de Portugal”, 01 de Outubro de 1956;

"Álbum da Canção", nº 51, 01 de Maio de 1967;

“Única”, 14 de Abril de 2006;

“Cabelo branco é saudade” (2005), programa do espectáculo, Porto, Teatro Nacional de São João;

https://www.ccb.pt/evento/fado-celeste-tributo-a-celeste-rodrigues-1923-2018/

Celeste Rodrigues s/d.

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Amália Rodrigues e Celeste Rodrigues Madrid, 1943

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  • Flor Na Tua Mão Celeste Rodrigues (David Mourão-Ferreira / João Noronha)

Programa | Program Luso, 1954, p.3